O Dono da Bola: A transformação dos times de futebol em empresa
- Em 28/07/2023
Em agosto de 2019, a Lei nº 14.193/19 aprovou a criação de um novo subtipo societário, a sociedade anônima do futebol (“SAF”), cujo objeto social deve ser a prática do futebol, feminino e masculino, em competição profissional.
E, desde então, 3 times brasileiros colocaram em prática a transformação do tipo societário para SAF: Cruzeiro (MG), Botafogo (RJ) e Vasco da Gama (RJ), Bahia (BA) obtendo sucesso na busca de investidores.
Enquanto outros times já se converteram em SAF, aguardando investidores ou negociando com estes, como a Portuguesa (SP), América (MG), Figueirense (SC), Santa Cruz (PE) e o Paulista de Jundiaí (SP).
Tal tipo societário se aproxima do sistema hoje existente nos Estados Unidos e Europa, em que times de basquete, futebol americano, futebol e outros esportes.
Te convidamos hoje a entender mais um pouco sobre o SAF, esse novo subtipo societário que está atraindo a atenção das pessoas:
- O que é o SAF?
- Quais as vantagens do SAF?
- A sucessão do passivo;
- Quais as desvantagens do SAF?
- Em que contexto ocorre a transformação de uma associação em SAF?
O que é o SAF?
“Sociedade Anônima de Futebol” refere-se a clubes de futebol que são constituídos sob a forma jurídica de sociedade anônima.
Em alguns países, clubes de futebol podem ser registrados como empresas, e nesse caso, eles podem optar por adotar a estrutura de sociedade anônima.
Uma sociedade anônima é uma forma jurídica de organização empresarial em que o capital é dividido em ações pertencentes a diferentes acionistas. A responsabilidade dos acionistas está limitada ao valor das ações que possuem, e a empresa pode ser gerenciada por um conselho de administração.
Vários clubes de futebol ao redor do mundo adotam essa estrutura empresarial para fins de gestão e financiamento, permitindo que pessoas físicas ou jurídicas se tornem acionistas e contribuam financeiramente para o clube.
Muitas celebridades como David Beckham, Ryan Reynolds, Le Bron James e Matthew McConaughey são sócios de clubes esportivos.
Quais as vantagens do SAF?
Uma SAF permite que equipes de futebol se tornem clube-empresas, separando o futebol da parte social e tendo agora fins lucrativos, o que difere dos tradicionais clubes.
Ainda, no Brasil, em que os times de futebol têm dívidas em valores extremamente autos, os investimentos realizados contribuem para o pagamento dos passivos dos times, como o que aconteceu com o Cruzeiro.
A redução do passivo a e respectiva redução dos custos de gestão de time de futebol ao separar a atividade de clube social, permitem que se concentre os investimentos no treinamento e contratação de jogadores.
Ainda, sob a perspectiva de credores, a atual constituição associativa das agremiações esportivas não permite aos credores o acesso aos balanços, balancetes, acervo patrimonial declarado e demais informações financeiras e societárias, ou mesmo estatutárias, o que é possível em outros tipos empresariais, inclusive mediante laudos realizados por empresas de auditoria externa, para fins de correta aferição e análise de proposta de pagamento.
Assim, a lei que instituiu o SAF criou a figura da sociedade anônima do futebol exatamente para permitir medidas de controle, governança, transparência, entre outras, que a esmagadora maioria das associações sem fins lucrativos nunca priorizou, impossibilitando os credores de terem meios de acessar informações contábeis com clareza e exatidão.
A sucessão do passivo
Os benefícios especificados na Lei do SAF, estão diretamente vinculados a transformação do clube ou pessoa jurídica original em SAF, considerando que esta última será a garantidora dos credores caso o clube não consiga pagar as dívidas no extenso período de dez anos, estabelecido em lei.
Deve-se distinguir as obrigações de cada parte formada nesse novo modelo de relação entre sucessora (SAF) e sucedido (clube ou pessoa jurídica original). Apesar da sucessão trabalhista/empresarial, os clubes ou pessoas jurídicas originais (sucedidos) não deixarão de existir, havendo na Lei nº 14.193/2021 expressa vinculação empresarial.
Certamente, o tema da sucessão trabalhista e/ou formação de grupo econômico virá a ser discutido judicialmente.
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A Lei do SAF determina um novo sistema para concurso de dívida denominado ‘Regime de Centralização das Execuções” (RCE), mediante a formação de concurso de credores, o qual somente poderá ser implementado com o auxílio da figura garantidora e solidária da SAF, ou caso essa última figure na condição de acionista do clube original.
Importante destacar que no RCE a sucessão do passivo encontra limitações, na medida em que, segundo seu artigo 9º, “a Sociedade Anônima do Futebol não responde pelas obrigações do clube ou pessoa jurídica original que a constituiu, anteriores ou posteriores à data de sua constituição, exceto quanto às atividades específicas do seu objeto social, e responde pelas obrigações que lhe forem transferidas conforme disposto no §2º do artigo 2º desta Lei, cujo pagamento aos credores se limitará à forma estabelecida no artigo 10 desta Lei”.
Ademais, a Lei da SAF criou um mecanismo chamado Regime Centralizado de Execuções, que possibilitou uma esteira para pagamento de credores de natureza cívil e trabalhista. Sendo assim, a empresa assume a responsabilidade de contribuir para o pagamento da dívida, com 20% de suas receitas mensais.
Quais as desvantagens do SAF?
Na medida em que transforma o subtipo societário do time de futebol em SAF, algumas regras das sociedades anônimas passam a ser válidas, como os direitos dos acionistas a voto nas decisões da SAF.
Qual seja, não há mais um órgão dirigente que toma as decisões administrativas, mas uma assembleia geral na qual os investidores têm direito a voto que tem de aprovar as decisões.
Além disso, a SAF deve eleger conselho fiscal para fiscalizar os atos dos administradores o que certamente, garante mais transparência a credores e investidores, ao mesmo tempo que cria regras para a tomada de decisões.
Outro ponto importante a ser analisado é que a SAF deve pagar seu passivo, sendo que nem todo capital trazido por investidores poderá ser investido em contratação de jogadores, por exemplo.
Em que contexto ocorre a transformação de uma associação em SAF?
A Lei da SAF veio em um contexto de intenso endividamento dos times de futebol e dos direitos dos credores de receber os valores aos quais estes têm direito.
Estamos falando da satisfação de direitos de credores e da “profissionalização administrativa e societária” do futebol no Brasil, na medida em que se traz profissionalização a um negócio que gera milhões de reais todos os anos.
A administração de times de futebol por dirigentes tem sido alvo de críticas por muito tempo, na medida em que não há transparência e os credores têm seus direitos desrespeitados reiteradamente. Ainda pior, na medida em que há recursos financeiros, os times não podem investir em jogadores e treinamento.
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