
A Regulamentação da Reforma Tributária: Houve alteração do ITCMD??
- Em 06/03/2025
Em 17.1.2025, o Presidente Lula sancionou o Projeto de Lei nº 68/2024, que se transformou na Lei Complementar nº 214/2025, regulamentando parte da Reforma Tributária.
A Lei Complementar nº 214/2025 inicia a implementação do novo sistema tributário brasileiro, vigorando a partir de 2027.
É importante notar que a lei complementar sancionada institui o Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, a Contribuição Social sobre Bens e Serviços – CBS – e o Imposto Seletivo – IS, criando o Comitê Gestor do IBS, e não trata de temas polêmicos, como a alteração das regras do ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação e o imposto sobre grandes fortunas, instituindo apenas parte da regulamentação da Reforma Tributária.
Hoje, vamos conversar sobre os impostos que a Lei Complementar nº 214/2025 altera, bem como sobre os próximos passos do governo federal para implementar a Reforma Tributária:
· A Lei Complementar nº 214/2025:
· Impostos substituídos;
· O período de transição.
· O PL nº 108/2024 continua em tramitação?
· E o ITCMD?
· O ITCMD hoje;
· O ITCMD e o Projeto de Lei nº 108/2024:
· A Alíquota Progressiva;
· O impacto da alíquota progressiva no Estado de São Paulo;
· As alterações da base de cálculo do ITCMD.
· A importância da arquitetura sucessória.
A Lei Complementar nº214/2025
Impostos Substituídos
A nova legislação substitui, gradualmente, cinco tributos (PIS, Cofins, ICMS, ISS e parcialmente o IPI) pela Contribuição Social sobre Bens e Serviços – CBS – e pelo Imposto sobre Bens e Serviços, entrando em vigor em 2027.
Em 2027, também será criado o Imposto Seletivo que incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
O período de transição
O período de transição para a total implantação da Reforma Tributária durará até 2033.
O PL nº 108/2024 continua em tramitação?
Parte relevante da Reforma Tributária é objeto de regulamentação conforme o Projeto de Lei nº 108/2024, o qual continua em tramitação no Poder Legislativo.
O Projeto de Lei nº 108/2024 foi redigido para complementar e operacionalizar a reforma tributária já aprovada e, se aprovado com a atual redação, trará mudanças muito representativas na tributação do patrimônio, ao tratar, por exemplo, de impostos como o ITCMD, que passará a ser obrigatoriamente calculado por alíquota progressiva.
E o ITCMD?
A alteração das alíquotas e das regras de incidência de impostos, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e o Imposto de Renda sobre ganhos de capital podem resultar em um cenário tributário diferente do atual, afetando diretamente a sucessão de bens e as estratégias de planejamento sucessório adotadas pelas famílias.
Além das mudanças nos impostos, a reforma tributária aprovada também trará novos instrumentos e mecanismos fiscais que impactarão a transmissão de bens familiares. A criação de novas modalidades de tributação, a simplificação de procedimentos fiscais e a introdução de incentivos fiscais podem influenciar as decisões relacionadas ao planejamento sucessório, exigindo uma revisão e adaptação das estratégias adotadas pelas famílias.
Em suma, a atual discussão sobre a reforma tributária representa um desafio e uma oportunidade para as famílias brasileiras repensarem suas estratégias de sucessão e garantirem a preservação do seu legado de forma eficiente e sustentável.
O ITCMD Hoje
O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) é um imposto estadual que incide sobre a transmissão de bens e direitos em caso de falecimento do titular (causa mortis) ou na doação de bens.
O cálculo do ITCMD pode variar de conforme a legislação de cada estado, mas, em geral, o processo envolve as seguintes etapas:
- Base de Cálculo A base de cálculo do ITCMD é o valor dos bens ou direitos transmitidos. Isso pode incluir dinheiro, imóveis, veículos e outros bens.
- Alíquota Cada estado define suas próprias alíquotas, que geralmente variam entre 2% e 8%. Essa alíquota é aplicada sobre a base de cálculo. No Estado de São Paulo, a alíquota é de 4%.
- Cálculo do Imposto O valor do imposto é calculado multiplicando a base de cálculo pela alíquota definida pelo estado. Por exemplo, se a base de cálculo for R$100.000 e a alíquota for de 4%, o ITCMD seria R$4.000.
O ITCMD e o Projeto de Lei nº 108/2024
A alíquota progressiva
Alíquota progressiva é um tipo de sistema de tributação onde a taxa de imposto aumenta conforme a base de cálculo ou a renda do contribuinte cresce. Isso significa que, à medida que a renda ou o valor do bem aumentam, a porcentagem de imposto cobrada sobre esses valores também aumenta.
Esse sistema é comumente utilizado em tributos como o Imposto de Renda: Em muitos países, incluindo o Brasil, a alíquota do Imposto de Renda é progressiva. Rendas menores são taxadas a uma alíquota menor, enquanto rendas maiores são taxadas a uma alíquota maior.
Em alguns estados, como o Rio de Janeiro, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) também pode ter alíquotas progressivas em alguns estados, onde doações ou heranças de valores mais altos são tributadas a uma taxa maior.
O objetivo da alíquota progressiva é promover uma maior justiça social, fazendo com que quem ganha mais ou possui mais bens contribua proporcionalmente mais para o financiamento de serviços públicos e políticas sociais.
O impacto da alíquota progressiva no Estado de São Paulo
Para os residentes no Estado de São Paulo, o impacto da aplicação da alíquota progressiva será maior do que em outros estados, como o Rio de Janeiro, uma vez que em São Paulo é aplicada alíquota fixa de 4% (quatro por cento) fixa, ou seja, independentemente do valor do benefício financeiro do espólio ou da doação.
Dependendo do montante do valor do patrimônio, poderão ser aplicadas alíquotas de 0% até 8%, o que significa um aumento de até 100%.
As alterações da base de cálculo do ITCMD:
O Projeto de Lei Complementar nº 108/2024 também busca alterar a base de cálculo do ITCMD, o que pode aumentar ainda mais o impacto da alíquota progressiva. Vejamos:
Bens Imóveis
Quanto aos bens imóveis, o PL determina que a base de cálculo para o ITCMD sobre bens imóveis é o “valor de mercado de bem imóvel ou direito relativo a bem imóvel”, “fixado por meio de planta de valores, elaborada com fundamento em metodologia estatística tecnicamente idônea”.
Ou seja, deixa de ser aplicável o valor da transação, determinando-se como único valor para base de cálculo montante similar ao valor venal de referência, aumentando significativamente o valor da base de cálculo do ITCMD.
Um exemplo muito comum neste caso são os imóveis, objeto de inventário, adquirido nos anos 50 ou 60, por exemplo.
Se um pai doar a um filho um imóvel adquirido em 1957 pelo valor atualizado de R$ 40.000,00, localizado em um bairro nobre e cujo valor de mercado atual é de R$ 1.500.000,00, então pela legislação atual, o ITCMD poderia ser calculado sobre o valor histórico de R$40.000,00, mediante o recolhimento do ITCMD de R$1.600,00. Porém, segundo o PL, deveria ser recolhido o ITCMD no valor de R$60.000,00, um aumento de 3.750%, considerando a alíquota de 4%. Se aplicarmos a alíquota de 8%, o valor a ser recolhido seria de R$120.000,00, resultando num aumento de 7.500%.
Fica evidente que o aumento é expressivo!
Participações Societárias
Em alguns estados, o ITCMD calculado sobre a doação e/ou transmissão causa mortis de participações societárias é calculado sobre o valor nominal de quotas, ou ações, na data do falecimento, como o Estado de São Paulo.
As quotas ou ações negociadas em mercados organizados, como a B3, devem ser negociadas com base na data da operação de doação ou do falecimento, isso não foi alterado.
Contudo, as quotas e ações de sociedades que não sejam negociados em mercados organizados, devem ter o ITCMD calculado de acordo com “metodologia tecnicamente idônea”, tendo como valor mínimo de base de cálculo o patrimônio líquido ajustados pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado, acrescido de fundo de comércio (o qual inclui valor da marca, estoque, local, dentre outros).
Na prática, isto significa dizer que, se antes se declarava o valor de uma quota com base em seu valor nominal, ou seja, aquele constante em contrato social, se passa a calcular o ITCMD sobre o patrimônio líquido de uma pessoa jurídica, aumentando significativamente a base de cálculo do ITCMD.
Quando há imóveis em tal patrimônio, o PL especifica que este deve ser avaliado pelo valor de mercado, ou seja, afasta o cálculo do patrimônio líquido sobre o valor de aquisição (que, conforme a data de aquisição, pode ser significativamente inferior ao valor de mercado).
Se, por exemplo, um pai doaria a um filho 2.000 quotas de sua empresa (o equivalente a 10% de seu capital social) cujo valor nominal é de R$ 1,00 cada uma, a qual tem como patrimônio imóveis cujo valor de aquisição, exemplificativamente, seria de R$ 500.000,00 e o valor de mercado de R$ 4.000.000,00, como no caso de muitas holdings patrimoniais.
Hoje, no Estado de São Paulo, o ITCMD seria calculado sobre R$2.000,00, totalizando R$80,00.
Porém, com a aprovação da PL, o ITCMD seria calculado sobre o valor mínimo de R$ 4.000.000 (considerando apenas o valor de mercado de imóveis, e não levando em conta fundo de negócio e outros ativos) seria de R$ 160.000,00 (alíquota de 4%). Com a aprovação da alíquota progressiva de até 8%, tal valor poderia ser de até R$320.000,00.
Uma diferença de R$319.920,00 ou um aumento de 400.000%!
Bens e direitos objeto de trust no exterior
Segundo o PL nº 108/2024, os bens e objetos de trust no exterior passam a ser tributados, entendendo-se como fato gerador o falecimento do instituidor ou a distribuição pelo trust ao beneficiário, o que ocorrer primeiro.
Os demais contratos no exterior que sejam similares ao trust, bem como eventual “trust brasileiro”, conforme legislação a ser aprovada, também deverão ser tributados pelo ITCMD.
Neste caso, bens e direitos não tributados passariam a ser tributados!
Distribuição desproporcional de lucros
A PL prevê que, na hipótese de distribuição desproporcional dos lucros, caso o sócio receba lucros superiores à sua participação, sobre tal diferença incidirá o ITCMD.
Por exemplo, se um sócio possui 10% do capital social e recebe lucros equivalentes a 50% dos lucros de determinado exercício social, deverá ser recolhido o ITCMD sobre os 40% que excedem o seu percentual.
Na prática, isso representa um aumento significativo na tributação da distribuição desproporcional de lucros, pois antes não havia incidência de impostos e agora poderá haver cobrança de até 8% sobre o excedente.
A distribuição desproporcional dos lucros é muito comum hoje. Um sócio que possui 10 quotas, representando 0,1% do capital social, diante do acordo que possui com os demais sócios, recebe, por exemplo, R$14.000,00 mensais como distribuição de lucros. Contudo, o lucro mensal, em determinado mês, totalizou, por exemplo, R$180.000,00.
Nesse caso, 0,1% do lucro mensal representa R$180,00. O montante de R$14.000,00 representa 7,77% de R$180.000,00. Ou seja, tal sócio deveria receber, de acordo com a sua participação no contrato social, R$ 180,00 a título de lucros, devendo, então, ser recolhido o ITCMD no valor de R$ 552,80 (considerando a alíquota de 4%) a cada mês, o que em 12 meses totalizam R$ 6.633,60.
Na hipótese de ITCMD progressivo, o valor a ser recolhido mensalmente variaria de R$276,40 a R$1.105,60.
No Estado de São Paulo, esta situação é ainda mais grave, enquanto a Fazenda Estadual abriu uma delegacia específica para tratar das transações que envolvem o ITCMD e que vem autuando o contribuinte, ao entender que o valor recolhido não corresponde ao seu entendimento, o qual nem sempre é legal.
A importância da arquitetura sucessória.
Com o provável aumento do ITCMD, o planejamento sucessório torna-se uma ferramenta essencial para garantir a continuidade do legado e minimizar os custos tributários da sucessão de bens.
Uma das principais formas pelas quais o planejamento sucessório contribui para a redução dos custos tributários é por meio da antecipação de medidas estratégicas.
Ao planejar a transmissão de bens com antecedência, é possível identificar oportunidades de planejamento fiscal que permitam minimizar o impacto dos impostos sobre a herança. Por exemplo, a realização de doações em vida ou a utilização de estruturas jurídicas adequadas podem ser estratégias eficazes para reduzir a carga tributária sobre os bens transmitidos.
Além disso, o planejamento sucessório também envolve a escolha de instrumentos que permitam otimizar a gestão do patrimônio familiar de forma mais eficiente do ponto de vista tributário.
A criação de uma holding familiar, por exemplo, pode trazer benefícios significativos em termos de proteção patrimonial e economia fiscal. Essa estrutura permite centralizar a administração dos bens da família, facilitando a gestão e possibilitando a aplicação de estratégias tributárias mais vantajosas.
Outra estratégia comumente utilizada no planejamento sucessório para redução de custos tributários é a adoção de testamentos e acordos de família que contemplem disposições tributárias favoráveis para os herdeiros. Por meio desses instrumentos legais, é possível estabelecer cláusulas que visem a minimização dos impostos incidentes sobre a herança, garantindo assim uma transmissão de bens mais eficiente em termos fiscais.
Em resumo, o planejamento sucessório desempenha um papel fundamental na preservação do patrimônio familiar e na redução dos custos tributários envolvidos na sucessão de bens. Ao adotar estratégias e instrumentos adequados, as famílias podem garantir que a transição patrimonial ocorra de forma sustentável e eficiente, preservando assim não apenas o legado financeiro, mas também os valores e princípios que definem a identidade familiar ao longo das gerações. Investir tempo e recursos em um planejamento sucessório bem estruturado é, portanto, um passo essencial para garantir a continuidade e a prosperidade do patrimônio familiar no longo prazo.
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